Médico cansado e encostado à parede

A Federação Nacional dos Médicos (FNAM) saiu de mais uma reunião negocial praticamente como entrou: sem receber nenhuma proposta de grelhas salariais e quase sem avançar com as normas particulares de organização do trabalho médico. Houve, no entanto, uma surpresa: o Ministério da Saúde apresentou duas propostas de perda de direitos e de piores condições de trabalho para os médicos, que a FNAM considera absolutamente intoleráveis.

A proposta do Ministério da Saúde abre a porta ao fim do limite das listas de utentes por médicos de família, o que representaria um retrocesso na proximidade dos cuidados de saúde primários e na relação entre os médicos e os seus utentes, à custa da exaustão dos médicos de família.

Em relação às urgências hospitalares, a proposta da tutela prevê o aumento do limite de idade dos médicos para o trabalho noturno, de 50 para 55 anos, e do trabalho em serviço de urgência, de 55 para 60 anos. Assim, contrariando todas as boas práticas, o Governo espera resolver o problema das urgências promovendo a exaustão e o burnout dos médicos.

Esta proposta já tinha sido apresentada neste processo negocial, tendo sido rejeitada pelos sindicatos médicos, o que levou o Ministro da Saúde, Manuel Pizarro, a retirá-la da mesa de negociações. Infelizmente, o Ministro da Saúde voltou a acreditar que vai fixar médicos no Serviço Nacional de Saúde (SNS), surpreendendo a FNAM com o regresso desta proposta que hostiliza os médicos com ainda piores condições de trabalho.

A FNAM continua disponível para prosseguir as negociações, mas não pode aceitar a degradação das condições de trabalho dos médicos. Por isso, mantém-se a greve dos médicos de 8 e 9 de março, de forma a mostrar ao Governo que chegámos a uma situação insustentável. É fundamental inverter este caminho de deterioração do SNS, que o Ministério da Saúde tem imposto, e isso só será possível cuidando de quem cuida.

Hospital do Litoral Alentejano

O Sindicato dos Médicos da Zona Sul (SMZS), representado por André Arraia Gomes, dirigente do sindicato e membro do Conselho Nacional da Federação Nacional dos Médicos (FNAM), participou no debate «Serviço Nacional de Saúde no Concelho de Grândola», promovido pela Comissão de Utentes dos Serviços Públicos de Grândola, no dia 18 de fevereiro de 2023, em Grândola.

Desse debate, o SMZS destaca que 20% da população do concelho não tem médico de família e que, a partir das 22h, fica sem qualquer apoio médico (sem Serviço de Atendimento Permanente), tendo a população de deslocar-se, em média, 30 km até ao Hospital do Litoral Alentejano, sobrecarregando o seu serviço de urgência.

O Hospital apresenta enorme carência de médicos, o que se traduz nos tempos de espera para consulta, como, por exemplo, 500 dias para Otorrinolaringologia ou 400 dias para Ginecologia-Obstetrícia. Atualmente, o Hospital não possui internamento de Psiquiatria, nem consultas de Pediatria e apenas possui um único cardiologista. O SMZS apontou a dificuldade de fixação de médicos no Litoral Alentejano e que os incentivos dados pelo Governo são claramente insuficientes e de duração muito limitada (apenas 2 anos).

A escassez de médicos, especialmente no Hospital, está a conduzir a um crescimento progressivo do horário de fim-de-semana em Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia (SIGIC), num claro processo de indução de procura por este tipo de solução. O SIGIC atribui ao utente um vale-cirurgia que lhe permite realizar a sua cirurgia ao fim-de-semana, muitas vezes em instalações do SNS, mas numa forma de gestão praticamente privada. Trata-se de uma clara promiscuidade entre o serviço público e o privado, induzido pela escassez de recursos do público.

No dia 24 de fevereiro de 2023, decorreu uma reunião com médicos do Hospital do Litoral Alentejano. Nessa reunião informativa, aberta a todos os médicos, sindicalizados ou não, foram dadas a conhecer as principais propostas da FNAM, o ponto de situação das negociações com o Ministério da Saúde e os motivos que levaram à marcação de greve para os dias 8 e 9 de março de 2023.

A FNAM continuará o seu caminho na defesa do SNS, pois entende que é graças a este serviço público, que se quer universal, geral, gratuito e de qualidade, que é promovida a saúde e prevenida a doença da população do país.

Hospital Distrital de Santarém

O Sindicato dos Médicos da Zona Sul (SMZS) participou numa reunião com médicos do Hospital Distrital de Santarém (HDS), no dia 14 de fevereiro de 2023.

A enorme escassez de médicos em várias especialidades (Medicina Interna, Neurologia, Dermatologia, Gastrenterologia, Pedopsiquiatria, Ortopedia) coloca em causa a prestação de cuidados à população abrangida pelo hospital e até a existência dessas valências no futuro. Não são só as consultas e as cirurgias que ficam em atraso. Esta escassez de médicos põe em causa a realização de exames complementares de diagnóstico (da Radiologia e da Gastrenterologia, sobretudo), comprometendo a capacidade de diagnóstico e tratamento dos doentes internados.

O Serviço de Urgência vê-se forçado, nalguns dias, a não receber ambulâncias, desviando-as para outros hospitais, perante a escassez de profissionais.

A defesa da carreira médica, o aumento das grelhas salariais e a dedicação exclusiva (opcional e majorada), entre outras propostas da FNAM, são uma absoluta necessidade no presente, para que o Serviço Nacional de Saúde continue a existir no futuro.

Fachada do Hospital Beatriz Ângelo

A Urgência Pediátrica do Hospital Beatriz Ângelo (HBA), em Loures, vai encerrar no período noturno, a partir de 1 de março, por falta de médicos. Esta decisão prende-se com a saída de quatro pediatras, tornando-se assim impossível assegurar a escala de urgência 24 horas por dia. A Federação Nacional dos Médicos (FNAM) tem conhecimento de que está também em risco o assegurar da urgência pediátrica aos fins de semana.

Nos últimos cinco anos, mais de uma dezena de pediatras rescindiram contrato com o HBA, devido às más condições de trabalho e à sobrecarga de horas de trabalho, sobretudo em serviço de urgência, que chega a ser de mais de 48 horas extraordinárias por semana.

Também em relação ao Centro Hospitalar Barreiro-Montijo (CHBM), foi noticiado o encerramento da urgência pediátrica no período noturno a partir de 1 de março.

Recorde-se que no último concurso para admissão de recém-especialistas, foram abertas apenas 34 vagas para especialidades hospitalares, não sendo contemplada nenhuma vaga para a especialidade de Pediatria. A colocação através de concurso foi substituída pela contratação direta pelas instituições hospitalares, uma medida que retira transparência ao processo e cria desigualdades na sua distribuição, ao não ter em conta as necessidades de cada serviço e hospital.

O encerramento noturno das urgências pediátricas do HBA e do CHBM colocam em causa a assistência médica às crianças e adolescentes destas zonas da Área Metropolitana de Lisboa, onde são amplamente conhecidas as dificuldades de acesso a médico de família, deixando a população sem alternativas.

Para a FNAM, é urgente criar condições para fixar médicos e estancar a constante saída de médicos do Serviço Nacional de Saúde, que tem levado ao encerramento de urgências por todo o país. A FNAM mantém-se firme na negociação por melhores condições de trabalho e por grelhas salariais justas que compensem a massiva perda de 20% do poder de compra dos médicos na última década.

© Sindicato dos Médicos da Zona Sul