Caos de que Pizarro é responsável

Os dois dias do último fim de semana foram uma demonstração da incompetência e da irresponsabilidade do Ministério de Manuel Pizarro e do Governo, que assistem impávidos e sem tomar medidas urgentes para fazer face às consequências do seu plano de contingência. O que era suposto ser um plano para fazer face ao encerramento temporário do serviço de Ginecologia-Obstetrícia no Hospital Santa Maria (HSM), em Lisboa, redundou num caos que ameaça deixar toda a região de Lisboa e Vale do Tejo sem resposta para as necessidades.

 

O absurdo exemplifica-se desde logo pela insensatez de duplicar a capacidade de partos do Hospital São Francisco Xavier (HSFX), um dos locais de encaminhamento das grávidas do HSM, onde as unidades individuais de partos (box) passaram de 6 para 12 e onde até já se fazem dois partos por box com as utentes separadas apenas por uma cortina, mas mantendo inalterada a capacidade de internamento, sem capacidade de oferecer o número de internamentos proporcional ao aumento dos partos.

Com o Hospital Beatriz Ângelo (HBA) encerrado entre quinta e domingo, e o Hospital Garcia da Orta (HGO) entre sexta e domingo, o resultado foi que rapidamente o HSFX e o Hospital de Cascais (HC) esgotaram a sua capacidade, tendo ficado sem vagas de internamento o que obrigou à suspensão da realização de partos, uma vez que não havia capacidade instalada para poder internar as grávidas e os bebés.

A agravar este cenário, a Ginecologia e Obstetrícia do Hospital de Caldas da Rainha (HCR) está encerrada até ao final de outubro, e as grávidas são encaminhadas para o Hospital de Leiria (HL). Contudo, também este apresentou dificuldade em assegurar capacidade de resposta às grávidas da região.

Ao todo, entre o HSM, o HBA, o HGO, o HSFX, o HC, HCR e o HL, contamos sete unidades centrais de Ginecologia-Obstetrícia vítimas diretas da incompetência, má gestão e de organização do Ministério da Saúde (MS), com o fecho sistemático de serviços, a destruição do serviço de Obstetrícia do HSM, e sobretudo sem capacidade para responder à gritante falta de mais maternidades abertas na zona de Lisboa e Vale do Tejo.

Se nada for feito, o MS e o Governo devem saber que estão a colocar em risco as grávidas, que, na grande Lisboa, podem passar a ter que fazer mais de 75km para poder realizar os seus partos no Serviço Nacional de Saúde (SNS), com todas as consequências que advêm do risco associado a essa deslocação.

O mesmo governo que escolheu encaminhar as grávidas de baixo risco do SNS para o sector privado, pagando aos grandes grupos económicos 3000€ por cada parto vaginal, decidiu legislar unilateralmente um novo regime de trabalho para os médicos. O regime de dedicação plena proposto não tem o, acordo dos médicos, prejudica médicos e o SNS.

É emergente a criação de condições para que os médicos fiquem no SNS, mas o Governo escolheu manter as más condições de trabalho e baixos salários, empurrando-os para o setor privado e para o estrangeiro.

Webinar sobre nova lei das USF

O Tour da FNAM continua a mobilizar os médicos para que se recusem a exceder o limite legal das 150 horas de trabalho suplementar, exercendo a profissão e assistindo os utentes sem estarem condicionados pela exaustão. Assim, a 5.ª etapa do Tour da FNAM, será no dia 19 de setembro, pelas 21h00, num webinar dedicado à a nova lei das Unidades de Saúde Familiar. Pode aceder aqui ao webinar.

Métricas em saúde

Face à gritante falta de vontade em ouvir os médicos e em legislar para salvar o Serviço Nacional de Saúde, a FNAM responsabiliza o Ministério da Saúde e o Governo pelas consequências de unilateralmente esvaziarem as negociações e anuncia que intensificará a sua luta com, entre outras iniciativas, dois dias de greve nacional para todos os médicos a 17 e 18 de outubro, que se somam à greve marcada de 14 e 15 de novembro.

A frase que escolhemos para o título é de Manuel Pizarro, quando, em 1992, como médico, lutava contra as políticas de Arlindo de Carvalho, então Ministro da Saúde. Hoje a frase pode ser replicada tal e qual, com a ironia de, desta feita, se aplicar ao próprio Manuel Pizarro.

Depois de 16 meses de negociações, onde o Governo se recusou a incorporar as principais propostas dos médicos, o caminho legislativo vai avançar unilateralmente, com um prejuízo sem precedentes na carreira médica e do Serviço Nacional de Saúde (SNS).

A FNAM denuncia que o Governo não teve competência para chegar a um acordo sobre os temas do protocolo negocial assinado, mas é hábil a ludibriar os médicos e a opinião pública, com a falta de verdade do Ministério da Saúde (MS) relativamente ao valor do aumento proposto, que está muito longe dos 917€ anunciados, ficando-se pelos 107€, no caso da esmagadora maioria dos médicos nos regimes vigentes, da generalização de um modelo de USF economicista que limita a prescrição de exames e medicamentos, e numa dedicação plena que piora as condições de trabalho dos médicos, os exclui dos acordos de contratação coletiva, e prejudica os doentes.

Relativamente à área da Saúde Pública, a proposta do Ministério da Saúde de acabar com o regime de disponibilidade permanente sem a devida compensação é inaceitável para a FNAM, colocando em risco a resposta do país a emergências de saúde pública.

Consulte a análise detalhada à proposta do Governo.

O Governo tem manifestamente falta de vontade política em resolver a carência de médicos no SNS, mas é engenhoso na cativação do investimento do Orçamento de Estado para a Saúde para chegar às contas certas, escolhendo não investir nos seus profissionais.

A FNAM repudia esta escolha autoritária e irresponsável do Governo, que virou costas não só aos médicos, mas também aos utentes.

Este não era o resultado que desejávamos nem pelo qual temos vindo a lutar, mas o Governo não se mostrou à altura das suas responsabilidades e das necessidades do SNS, e continuará a encerrar serviços, desperdiçando soluções para fixar médicos, reforçar o SNS, e evitar o êxodo dos seus profissionais para o setor privado e estrangeiro em busca de salários dignos e melhores condições de trabalho.

Face à atitude demolidora do MS e do Governo, a FNAM não tem outra alternativa senão continuar e aprofundar as formas de luta, no volume e intensidade necessários para travar um pacote legislativo que vai agravar os problemas no SNS.

Assim, além da greve nacional de 14 e 15 de novembro, da manifestação do dia 14 de novembro, às 15h, à porta do Ministério da Saúde, do Tour da FNAM para continuar a mobilizar os médicos para que se recusem a exceder o limite legal das 150 horas de trabalho suplementar, e da ida a Bruxelas para reunir com Stella Kyriakides, Comissária Europeia para a Saúde, e com eurodeputados, decidimos:

  • Marcar mais dois dias de greve nacional, para todos os médicos, nos dias 17 e 18 de outubro, com concentrações regionais de médicos à frente das unidades de Saúde.
  • Convidar todas as organizações médicas e de Saúde, dos demais profissionais aos utentes, para uma plataforma para a luta conjunta em defesa da carreira médica e do SNS.

Ao contrário do que foi prometido e da expectativa que foi alimentada, o SNS continua desvalorizado pelo poder político, seja pelo atual governo seja pelos anteriores, de forma grosseira e agravada posto que essa desvalorização não é feita por falta de consciência das dificuldades. O governo sente-se confortável com a destruição irresponsável que quer normalizar no SNS. Nós, ao contrário, vamos continuar a lembrar que é preciso cuidar de quem cuida e apostados em salvar o SNS da mediocridade do MS e do Governo.

Lápis

A FNAM analisou aprofundadamente a proposta do Ministério da Saúde, que estabelece obrigações distintas para os médicos consoante a sua carreira, a sua idade e as funções que desempenham e propõe que os médicos aderentes ao novo regime de Dedicação Plena (DP) abram mão do Acordo Coletivo da Carreira Especial Médica. 

A proposta estabelece diferenças inaceitáveis entre as obrigações dos médicos aderentes consoante sejam da área Hospitalar, Medicina Geral e Familiar ou Saúde Pública.

No documento de análise, além de elencarmos todos os fatos e as contas de uma proposta governativa que, se não for travada, ditará o fim do Serviço Nacional de Saúde (SNS), divulgamos também os princípios gerais das propostas da FNAM em todo este processo, bem como a nossa Contra-Proposta de Grelha Salarial para os atuais regimes de trabalho dos médicos.

Leia na íntegra a análise da proposta do Ministério da Saúde sobre Dedicação Plena e valorização das grelhas salariais.

© Sindicato dos Médicos da Zona Sul